Webinar APCA junta profissionais de saúde para debater tireoidectomia

Webinar APCA junta profissionais de saúde para debater tireoidectomia

No dia 19 de setembro de 2024, a Associação Portuguesa de Cirurgia Ambulatória (APCA), em colaboração com a Sociedade Portuguesa de Cirurgia Endócrina (SPCENDO), realizou um webinar intitulado "Tireoidectomia: Limites atuais e tendências futuras em regime de ambulatório", moderado por Jelena Cassiano Neves e Sónia Vilaça.

O evento contou com 160 inscritos, incluindo sócios da APCA, sócios da SPCENDO, médicos internos, bem como não sócios, demonstrando o envolvimento ativo da comunidade médica e o interesse crescente na evolução da Cirurgia Ambulatória, particularmente no tratamento cirúrgico da patologia da tiroide.

 

Enquanto moderadora do Webinar Tiroidectomia, organizado pela APCA, em parceria com a Sociedade Portuguesa de Cirurgia Endócrina (SPCENDO) e Medtronic, como avalia a participação e o nível de envolvimento dos profissionais presentes?

Jelena Cassiano Neves (JCN) - No âmbito da celebração de 25 anos da APCA, a Secção de Cirurgia Geral organizou o Webinar dedicado a Tiroidectomia em regime ambulatório: Os limites atuais e as tendências futuras; um tema relevante e cativante que atraiu muitos profissionais com interesse em patologia da tiróide e em cirurgia de ambulatório.

Com o apoio da SPCENDO conseguimos reunir um grupo de palestrantes com a maior expertise nesta patologia, garantindo dessa maneira a qualidade do programa científico do tema abordado.

A participação dos profissionais presentes superou as expetativas da Comissão organizadora, o que resultou numa discussão enriquecedora com questões pertinentes e contribuições práticas dos intervenientes, tanto no que diz respeito à organização do circuito e à segurança das tiroidectomias em regime de ambulatório como na aplicação das novas tecnologias nesta área.

 

O principal tema em discussão foi a tiroidectomia em regime de ambulatório. Quais foram as principais preocupações ou perguntas levantadas neste âmbito?

JCN - Sendo a patologia tiroidea uma das poucas patologias ambulatorizáveis cujas complicações, embora raras, possam ser graves, nomeadamente o hipoparatiroidismo, a hemorragia e as lesões do nervo laríngeo com a obstrução das vias aéreas superiores, as principais preocupações dos intervenientes foram relacionadas com os critérios de inclusão, otimização do circuito dos doentes nas UCAs, a minimização do risco das complicações, a monitorização no pós-operatório imediato e os protocolos de atuação de emergência em caso de complicações precoces.

 

Foi abordada alguma novidade ou dado relevante discutido que considere pertinente destacar?

JCN - Foi discutido também o estado de arte da cirurgia da tiroide em Portugal. Os últimos dados fornecidos pela ACSS relativamente ao período entre janeiro e setembro de 2024, revelam que neste período foram feitas 2110 intervenções cirúrgicas da tiroidea com uma taxa de ambulatorização média nacional de 21,7%. É de salientar uma grande discrepância no que diz respeito a diferentes regiões, sendo a região de LVT a zona onde se registou a maior taxa de doentes operados em regime de ambulatório, nomeadamente cerca de 45%. A região Norte teve uma taxa de ambulatorização de 27%, seguida de região Centro com 14%. Este facto, vai de encontro com as recomendações internacionais, que sugerem que este tipo de cirurgia deve ser feito em regime de ambulatório nos centros de grande volume, com equipas dedicadas e com os recursos necessários.

 

A sessão incluiu várias abordagens cirúrgicas, desde a tiroidectomia aberta até técnicas robóticas e endoscópicas. Que técnicas despertaram maior curiosidade entre os profissionais presentes?

JCN - Entre as diferentes técnicas abordadas, as técnicas endoscópicas nomeadamente por via transoral vestibular (TOETVA), a abordagem transaxilar e a abordagem bilateral axilomamária (BABA) foram as que despertaram um grande interesse. Em Portugal, um grupo liderado pelo Dr. Jaime Vilaça já tem uma experiência de mais de 300 casos operados por via endoscópica, permitindo a criação de protocolos específicos e a análise dos resultados que são globalmente muito positivos.

A abordagem robótica também despertou uma curiosidade por parte dos participantes, embora a experiência acumulada a nível nacional seja modesta devido aos custos elevados desta técnica.

 

Com o avanço da tecnologia na área cirúrgica, o que foi destacado como o próximo grande passo na evolução da tiroidectomia?

JCN - O aperfeiçoamento das técnicas não invasivas existentes como a ablação por radiofrequência dos nódulos benignos acompanhada de aquisição das competências radiológicas (ecografia) dos cirurgiões endócrinos para a sua aplicação. Esta técnica percutânea evita o procedimento cirúrgico e elimina os riscos inerentes a intervenções invasivas. Atualmente as indicações são limitadas a patologia benigna, mas à medida que a tecnologia evolui, são esperados novos avanços e os aperfeiçoamentos nesta técnica, conduzindo a melhores resultados, ao alargamento das indicações e a uma maior aceitação e inclusão na prática clínica de rotina.

 

Quais foram as principais conclusões tiradas em relação à segurança do doente no contexto de novas tecnologias e técnicas minimamente invasivas?

JCN - O procedimento convencional permanece o tratamento de eleição, no entanto, a tiroidectomia endoscópica e robótica, introduziram novas dimensões à cirurgia tiroideia, oferecendo potenciais benefícios aos doentes e à sua qualidade de vida. As novas tecnologias também trazem novos desafios. O uso seguro de novas tecnologias que oferecem uma maior precisão intra-operatória e resultados esteticamente favoráveis depende fortemente do investimento institucional na formação adequada dos profissionais. Estas abordagens cirúrgicas minimamente invasivas da tiroide têm em comum tratar-se de procedimentos de alguma complexidade técnica, tempos operatórios mais longos, custos mais elevados e uma curva de aprendizagem maior associada a um aumento inicial das complicações pelo que a sua aplicabilidade rotineira no contexto de cirurgia de ambulatório ainda é controversa.

 

Na sua perspetiva, o que poderá ser ajustado nas tiroidectomias em regime de ambulatório, de modo a promover melhorias nos tratamentos prestados?

JCN - Tanto em regime de ambulatório, como em regime convencional o objetivo será sempre no sentido de minimizar o risco cirúrgico e a taxa de complicações graves. A utilização de instrumentos bipolares para hemóstase e a secção dos vasos, atualmente tem uma prática comum e possibilitou uma diminuição significativa dos tempos operatórios e das taxas de hematomas cervicais. Ao recorrer às técnicas adjuvantes tais como Neuroestimulação e Monitorização Intraoperatória do nervo laríngeo recorrente e da identificação das glândulas paratiroides (autofluorescência, fluorescência com recurso a verde indocianina, entre as outras), quando indicado, podemos minimizar ainda mais os riscos de complicações, e estas técnicas devem ser disponibilizadas aos cirurgiões pelas instituições.

Por outro lado, o investimento na implementação dos programas de telemonitorização no pós-operatório e em literacia em saúde dos utentes e familiares serão outras duas linhas de atuação importantes no sentido de melhoria dos cuidados prestados em regime de ambulatório.

 

Que impacto espera que este Webinar tenha na Cirurgia Ambulatória em Portugal?

JCN - O impacto esperado é multifacetado. Por um lado, esperamos que a partilha de experiências e dos conhecimentos durante o Webinar fortaleça a confiança dos profissionais nos centros com as condições necessárias de segurança e a qualidade de realizar este tipo de cirurgias em regime de ambulatório. Com a introdução das técnicas adjuvantes de mitigação dos riscos cirúrgicos e a consequente diminuição da taxa de complicações, esperemos que o regime de ambulatório no tratamento da patologia tiroidea se torne mais prevalente a nível nacional. A discussão sobre as técnicas endoscópicas e robóticas bem como as técnicas não invasivas percutâneas tiveram como objetivo a divulgação de avanços tecnológicos e uma reflexão sobre a sua aplicabilidade no contexto ambulatório.

 

Por fim, que mensagem gostaria de deixar aos profissionais de saúde que participaram?

JCN - Em nome da secção de Cirurgia Geral da APCA, gostaria de expressar os meus agradecimentos pela participação ativa e contributiva de todos os palestrantes, moderadores, comentadores e da assistência e à SPCENDO em particular pelo seu contributo na organização deste Webinar. O envolvimento de cada um, através de apresentações, comentários, reflexões e perguntas, foi fundamental para o sucesso deste evento. A troca de experiências e dos conhecimentos demonstra o compromisso de todos com a melhoria contínua da prática clínica e, especialmente, com a segurança dos doentes. Iremos continuar juntos nesta jornada de aprendizagem, de inovação e de partilha de experiências enriquecedoras.